O AniCura Atlântico Hospital Veterinário e a Fundação Champalimaud criaram recentemente uma parceria no âmbito da troca de conhecimentos sobre novas modalidades de identificação e marcação de linfonodos em cirurgia oncológica, um verdadeiro exemplo do que se pretende com o conceito One Health. “Como é sabido, a identificação e dissecção de linfonodos durante os procedimentos cirúrgicos pode ser um grande desafio, sendo que boa parte dos linfonodos de tamanho normal, devido à sua inclusão em tecido adiposo podem obrigar a um trauma de dissecção extenso, aumentando assim a morbilidade pós-operatória”, começa por explicar à VETERINÁRIA ATUAL, Fausto Brandão, médico veterinário no AniCura Atlântico Hospital Veterinário com especialidade em cirurgia de mínima invasão.
Tanto na área de medicina humana como na veterinária, “a cirurgia guiada por fluorescência é na atualidade um padrão de vanguarda”. Assim, a parceria de “ambas as instituições líderes no domínio nacional na área de cirurgia oncológica de mínima invasão, visa um intercâmbio de conhecimentos que se traduz na aplicação prática cirúrgica”, acrescenta.
“O conceito de One Health e a partilha de conhecimentos beneficia simultaneamente ambos os domínios médicos: veterinário e humano” – Catarina Carvalheiro, Fundação Champalimaud
Existe um contacto profissional entre a Fundação Champalimaud e o AniCura Atlântico Hospital Veterinário e na sequência da partilha de interesses sobre tecnologias de deteção de linfonodos e marcação/localização para cirurgia oncológica, as médicas cirurgiãs torácicas Catarina Carvalheiro e Rita Barata demonstraram interesse em conhecer o trabalho que o hospital veterinário está a realizar com o uso da tecnologia de cirurgia guiada por fluorescência com verde de indocianina. “Nesse sentido solicitámos poder acompanhar de perto os procedimentos, com o intuito de perceber a aplicabilidade da técnica em cirurgia oncológica em humanos, nomeadamente em cirurgia do carcinoma do pulmão”, explica Rita Barata.
Houve assim a possibilidade de as duas cirurgiãs assistirem à lobectomia (remoção de lobo pulmonar) de uma gata, a Francisca, de 11 anos, raça persa, por motivos de neoplasia primária. A grande diferenciação desta técnica, segundo Fausto Brandão, “é ser minimamente invasiva, sendo por isso designada de lobectomia VATS (do acrónimo “video-assisted thoracoscopic surgery”), onde através de uma técnica híbrida, com visão via toracoscopia, e uma incisão de mini-toracotomia, se procede à remoção de um lobo pulmonar diminuindo a morbilidade do paciente de forma muito significativa”. Além da técnica em si, o médico veterinário defende “o uso da cirurgia guiada por fluorescência com verde de indocianina, que facilita a marcação, identificação e dissecção de linfonodos, diminuindo a morbilidade associada a uma linfadnectomia não guiada”. Esta técnica é realizada apenas “em alguns centros veterinários diferenciados europeus, de entre os quais se destaca o AniCura Atlântico Hospital Veterinário, por ser o segundo de toda a Europa na aplicação da técnica de fluorescência”, acrescenta.
Para Catarina Carvalheiro, o intercâmbio de experiências visa melhorar, não só do ponto de vista técnico “o procedimento cirúrgico em si, como também a determinação de protocolos de administração e doses de fluoróforos marcadores para cirurgia guiada por fluorescência”. E, sublinha: “Acreditamos que o contínuo aprimoramento e a difusão de conhecimento são a chave para a melhoria do nível de qualidade de prestação de cuidados de serviços médicos e cirúrgicos em ambos os domínios”.
“(…) Muito com o apoio da classe veterinária em geral, que continuamente nos reconhece como uma entidade de referência, apostaremos em ser um centro de apoio nacional para a condução e tratamento de casos complexos, fortalecendo a nossa equipa de especialistas” – Fausto Brandão, AniCura Atlântico Hospital Veterinário
Modelo colaborativo rumo ao futuro
O paciente felino deslocou-se dos Países Baixos para Mafra com o intuito específico de realizar o procedimento por referenciação com Fausto Brandão, “que é já reconhecido a nível internacional como pioneiro no domínio da cirurgia guiada por fluorescência”, denota Rita Barata. A marcação de linfonodos por via de fluorescência com verde de indocianina está ainda numa fase inicial, mas acredita-se que, “num futuro próximo, com a introdução de marcadores tutorais específicos associados a fluoróforos, irá contribuir decisivamente para aumentar a especificidade em muitas das neoplasias comuns, ainda que poderá representar custos acrescidos para a tecnologia”.
Enquanto membro da Sociedade internacional de Cirurgia Guiada por Fluorescência o médico veterinário tem participado ativamente junto desta entidade, nos últimos três anos, com vista ao desenvolvimento de protocolos para aplicação no âmbito clínico. “Tendencialmente todos os resultados clínicos no domínio veterinário têm sido apresentados de forma a partilhar os sucessos e insucessos, pois a cirurgia guiada por fluorescência ainda está numa fase de desenvolvimento tendo praticamente sido implementada na rotina humana há cerca de seis para sete anos de forma transversal”, explica. Na medicina veterinária, o uso na rotina clínica teve uma introdução e expansão lenta e gradual desde o ano 2021-2022 com o aparecimento de novos equipamentos, destaca.
Catarina Carvalheiro afirma que “o conceito de medicina translacional e o comum uso de técnicas e tecnologias, quer no domínio cirúrgico, quer médico, é atualmente um modelo de sustentação e de evolução contínua das especialidades médicas. O conceito de One Health e a partilha de conhecimentos beneficia simultaneamente ambos os domínios médicos: veterinário e humano”. Fausto Brandão concorda com esta opinião da colega. “Acreditamos diariamente e fazemos esforços para continuar a desenvolver áreas relacionadas com oncologia médica e cirúrgica, pois esta já é reconhecida como uma das especialidades do futuro, tendo em conta a elevada frequência de apresentação clínica de doença no domínio oncológico.” E, sublinha: “Nesse sentido, e muito com o apoio da classe veterinária em geral, que continuamente nos reconhece como uma entidade de referência, apostaremos em ser um centro de apoio nacional para a condução e tratamento de casos complexos, fortalecendo a nossa equipa de especialistas”.
A permanente colaboração entre unidades de várias áreas médicas e a publicação de trabalho conjunto tem como objetivo “otimizar a validação e expansão de resultados clínicos, que uma vez implementados poderão servir a área médica de forma conjunta” defende Rita Barata, da Fundação Champalimaud
A permanente colaboração entre unidades de várias áreas médicas e a publicação de trabalho conjunto tem como objetivo “otimizar a validação e a expansão de resultados clínicos, que uma vez implementados poderão servir a área médica de forma conjunta”, explica Rita Barata que recorda o facto de todos os protocolos médicos “passarem sempre por várias fases de ensaio clínico e a medicina transacional entre espécies contribui obrigatoriamente para a validação de técnicas e procedimentos”, conclui.